segunda-feira, 5 de abril de 2010

Grandes Cordelistas-Parte I

Cidadão de Diadema
A literatura de cordel, que foi muito importante para a formação da cultura brasileira, e que informou e alfabetizou muita gente num tempo em que rádio era coisa rara e jornal só circulava nas capitais e escolas eram escassas, vem sendo utilizada como instrumento de incentivo à leitura de jovens e adultos em São Paulo, especialmente em Diadema, onde reside o poeta cearense Moreira de Acopiara, por meio de palestras e debates com alunos em escolas estaduais e municipais.O poeta, nascido em Acopiara (daí o sobrenome artístico), usa a própria experiência para justificar o sonho de levar aos não-letrados ou pouco letrados o gosto pelas palavras. “Fui alfabetizado lendo jornal e cordel. Quando fui para a escola já era adulto, mas tive a sorte de ter uma mãe (Nair Rolim, falecida há três anos) que apesar de pouco estudo tinha sensibilidade e era uma leitora voraz e de bom gosto. Quando se casou levou para casa livros de Raquel de Queiroz, Graciliano Ramos, Machado de Assis e Castro Alves. E muitos cordéis. Por isso, antes de pisar em uma escola eu já tinha intimidade com as palavras”, relembrou Moreira.InspiraçãoO sonho de se tornar escritor brotou da leitura dos autores anteriormente citados. Patativa do Assaré, um dos mais importantes poetas populares do Brasil, foi outra grande fonte de inspiração. “Quando pequeno eu ouvia um programa que ele tinha numa rádio de Juazeiro, onde declamava seus poemas. Às vezes pensava: Quando crescer, quero ser como ele”.O cordel, lembra o escritor, foi um dos primeiros instrumentos de alfabetização de muitas famílias nordestinas. “Isso bem antes de eu nascer. No período da segunda guerra mundial (1939 a 1945), por exemplo, havia poucos jornais. Muitos cordelistas ouviam a notícia no rádio para depois produzir o chamado cordel reportagem, com o relato dos fatos”.OrigensMoreira de Acopiara – nascido em 1961, com o nome de Manoel Moreira Júnior, ensaiou seus primeiros versos com 14 anos. Desde então não parou. Aos 32 anos publicou o primeiro livro, Meu Jeito de Ser Feliz (1993). No total já são quatro livros publicados e perto de 100 cordéis. Seu livro mais recente, Com o Pé Direito na Frente (2003), está na terceira edição. “Em todos eles eu abordo a saudade da vida sertaneja, os problemas sociais, amor e humor”, resume.Recentemente Moreira de Acopiara esteve na Região, na cidade de Acopiara, onde organizou juntamente com outros cordelistas e violeiros o I Festival de Cantoria. Também participou do Programa Nordeste Caboclo, fazendo o lançamento do Livro Com o Pé direito na frente, composto por 31 poesias. Sendo esta sua terceira reedição. O livro traz poemas como iIdades, Perseguição, Um Soneto à Aristides Theodoro, Um carta a Satanás, Perdão, Senhor, entre outros como Dois Brasis, Com o Pé direito na Frente, titulo dado ao livro, A Política Restaurada, entre muitos outros.Moreira de Acopiara diz não ter tido uma infância dura, como a grande maioria dos meninos e meninas de sua idade. “O lugar onde nasci (sítio Cantinho) até hoje não tem energia elétrica. No entanto fui um privilegiado. Meu pai (Né Rufino) tinha terra e bom gado. Cresci no meio da fartura. Mas nos finais de semana e nas férias meu pai dispensava os empregados. Com isso, eu e meu irmão mais velho (Eduardo) tínhamos que pôr a mão na massa”.O outro lado da vida Moreira de Acopiara conheceu aos 20 anos de idade. O pai, já de idade avançada, vendeu a terra e todos se mudaram para a cidade. Sem perspectivas, o jeito foi fazer a mala e partir para São Paulo em busca de algum trabalho que lhe garantisse a sobrevivência. “Em Diadema fui acolhido por uma tia. Inicialmente trabalhei de auxiliar de escritório, mas foi pouco tempo. Depois trabalhei de garçom e, por fim, de vendedor”.Corria a década de 1980 e essa nova realidade reforçou no então jovem Moreira o desejo de se projetar como poeta. “Aprofundei-me na leitura dos clássicos da literatura universal e na produção textual, apesar do pouco tempo disponível. Hoje o meu processo de criação é diferente. Não escrevo nada. Quando decido fazer um poema sobre um determinado tema eu penso uma estrofe, memorizo, penso outra, mais outra, e quando dou fé o poema está pronto e retido na memória. Aí me sento e escrevo. Trabalhar como garçom me ajudou nesse sentido, porque eram muitas horas de muita correria e eu não podia parar para escrever. Foi nessa época que desenvolvi essa técnica de pensar meus poemas e memorizar tudo”, ressalta.ProfissionalismoHoje Moreira de Acopiara vive de poesia popular, especificamente literatura de cordel, que atravessa uma excelente fase. “Mas batalhei muito para isso”, acrescenta. Membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), desde 2005, o poeta Moreira de Acopiara tem percorrido o Brasil fazendo palestras em escolas e universidades. Também ministra ‘workshops’ e oficinas sobre literatura de cordel. Viaja ao Nordeste duas/três vezes por ano e tem por Acopiara um carinho muito especial. Tem mais dois livros prontos: Roda de Glosas e Fábrica de Verso, que deverão ser publicados brevemente. No momento trabalha em mais um livro, focado na cultura dos cantadores repentistas do Nordeste.


Patativa do Assaré Mestre do Cordel
Antônio Gonçalves da Silva, dito Patativa do Assaré, nasceu a 5 de março de 1909 na Serra de Santana, pequena propriedade rural, no município de Assaré, no Sul do Ceará. É o segundo filho de Pedro Gonçalves da Silva e Maria Pereira da Silva. Foi casado com D. Belinha, de cujo consórcio nasceram nove filhos. Publicou Inspiração Nordestina, em 1956, Cantos de Patativa, em 1966. Em 1970, Figueiredo Filho publicou seus poemas comentados Patativa do Assaré. Tem inúmeros folhetos de cordel e poemas publicados em revistas e jornais. Está sendo estudado na Sorbonne, na cadeira da Literatura Popular Universal, sob a regência do Professor Raymond Cantel. Patativa do Assaré era unanimidade no papel de poeta mais popular do Brasil. Para chegar onde chegou, tinha uma receita prosaica: dizia que para ser poeta não era preciso ser professor. 'Basta, no mês de maio, recolher um poema em cada flor brotada nas árvores do seu sertão', declamava. Cresceu ouvindo histórias, os ponteios da viola e folhetos de cordel. Em pouco tempo, a fama de menino violeiro se espalhou. Com oito anos trocou uma ovelha do pai por uma viola. Dez anos depois, viajou para o Pará e enfrentou muita peleja com cantadores. Quando voltou, estava consagrado: era o Patativa do Assaré. Nessa época os poetas populares vicejavam e muitos eram chamados de 'patativas' porque viviam cantando versos. Ele era apenas um deles. Para ser melhor identificado, adotou o nome de sua cidade. Filho de pequenos proprietários rurais, Patativa, nascido Antônio Gonçalves da Silva em Assaré, a 490 quilômetros de Fortaleza, inspirou músicos da velha e da nova geração e rendeu livros, biografias, estudos em universidades estrangeiras e peças de teatro. Também pudera. Ninguém soube tão bem cantar em verso e prosa os contrastes do sertão nordestino e a beleza de sua natureza. Talvez por isso, Patativa ainda influencie a arte feita hoje. O grupo pernambucano da nova geração 'Cordel do Fogo Encantado' bebe na fonte do poeta para compor suas letras. Luiz Gonzaga gravou muitas músicas dele, entre elas a que lançou Patativa comercialmente, 'A triste partida'. Há até quem compare as rimas e maneira de descrever as diferenças sociais do Brasil com as músicas do rapper carioca Gabriel Pensador. No teatro, sua vida foi tema da peça infantil 'Patativa do Assaré - o cearense do século', de Gilmar de Carvalho, e seu poema 'Meu querido jumento', do espetáculo de mesmo nome de Amir Haddad. Sobre sua vida, a obra mais recente é 'Poeta do Povo - Vida e obra de Patativa do Assaré' (Ed. CPC-Umes/2000), assinada pelo jornalista e pesquisador Assis Angelo, que reúne, além de obras inéditas, um ensaio fotográfico e um CD. Como todo bom sertanejo, Patativa começou a trabalhar duro na enxada ainda menino, mesmo tendo perdido um olho aos 4 anos. No livro 'Cante lá que eu canto cá', o poeta dizia que no sertão enfrentava a fome, a dor e a miséria, e que para 'ser poeta de vera é preciso ter sofrimento'. Patativa só passou seis meses na escola. Isso não o impediu de ser Doutor Honoris Causa de pelo menos três universidades. Não teve estudo, mas discutia com maestria a arte de versejar. Desde os 91 anos de idade com a saúde abalada por uma queda e a memória começando a faltar, Patativa dizia que não escrevia mais porque, ao longo de sua vida, 'já disse tudo que tinha de dizer'. Patativa morreu em 08 de julho de 2002 na cidade que lhe emprestava o nome.

Texto adaptado pela Professora Andrea

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